domingo, 30 de dezembro de 2012

momento poético



564. polir sóis com uma peneira 25 dezembro 2012


polir textos é como arear pratas
perde-se sempre algo
nunca se sabe se o brilho que fica
é maior do que o sujo limpo

polir amizades é como sacudir o pó
com a gentileza de uma pena
nada se perde nem se transforma
basta um gesto, um telefonema
uma sms, mensagem
talvez apenas um like no Facebook
como se fosse natal todos os dias

polir matrimónios é complicado
como diamantes em bruto
pode partir-se a agulha ou o casamento
e em vez de 24 ficam 6 quilates
questão de sorte e perícia
em panos de fina seda

polir países é arriscado
as limas devem ser afiadas
à prova de lóbis e governos
cortam-se as esquinas angulosas
talham-se as aparas mais finas
em areias de fina brancura
é como ir ao barbeiro do futuro
ao alfaiate do tempo
encomendar um fato por medida
para dar com a cor do cabelo
e há o risco de cortar o país todo
talhar pessoas trinchar tradições
sem memória nem história
serrar distritos, fender concelhos
encurtar fronteiras até ao mar
e finava-se Portugal em praias e arribas


polir palavras é bem mais fácil
corta-se uma folha de papel em A4
verifica-se a tinta nos tinteiros
gravam-se carateres como granito
basalto, quartzo ou ametista
lavram-se sulcos como rios
erguem-se sombras como montanhas
sombras de marés vivas
deixa-se a marinar antes do banho-maria
leva-se ao lume brando com pitada de sal
junta-se pimenta a gosto e louro e basilicão
retira-se do fogo e serve-se a gosto

sempre sonhei ser poeta
navegar em utopias
escrever cardápios de vida
imensos e belos como o oceano
livres e úteis como o ar
na solidão dos mares açorianos


chrys chrystello dez 2012




565. solitudes 31 dezembro 2012


solidão não me assusta
estar sozinho sim

silêncio não me assusta
solilóquio sim

inverno não me assusta
cinzento sim

multidões não me assustam
estar só no meio delas sim

a poesia é uma arma
carregada de solitude



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